segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Uma introspecção de um pseudo-solitário introvertido

Minha vida inteira eu me defini como solitário, mas estava errado: sou uma pessoa introvertida.

Introvertidos são constantemente introspectivos; isso é explicado pelo tempo que passam sozinhos, pensando sobre assuntos diversos, dos mais complexos aos mais imbecis. E nas minhas mais recentes introspecções, percebi o quanto extrovertidos têm me irritado.

Qualquer ser humano tem a tendência de se irritar com pessoas opostas a si, e isso é perfeitamente compreensível pelo fato de não compreendermos porque cargas d'água elas escolheram o caminho que nós nos negamos a seguir.
O problema é que temos muito mais propensão a nos irritarmos e sermos intolerantes com pessoas que possuem o mesmo defeito que nós; isso só acontece quando este defeito nos causa desconforto em reconhecê-lo em si mesmos. Pessoas que escondem sua baixa auto-estima atrás de qualquer mecanismo de compensação (por exemplo, exacerbado nível de vaidade estética) costumam se irritar com outras pessoas com baixa auto-estima, justamente por enxergarem na outra seus monstros escondidos, escancarados de uma forma quase caricata de tão honesta. A honestidade nos dói.

Pensando nesse sistema de autodefesa tão frágil que nós possuímos, fiquei tentando entender o porque de pessoas extrovertidas me irritarem. Mas antes disso, preciso explicar sobre a minha antiga concepção de solidão.

Desde pequeno eu gostei de ficar sozinho, no meu mundo; beirando vinte e oito anos, duvido que mudarei isso algum dia. Como dizem, "eu vivo fechado no meu mundinho porque ele é muito mais legal que o seu". Prefiro trabalhar e resolver problemas sozinho. Prefiro estudar, cozinhar, tomar café, fumar, escrever, desenhar e tudo o mais que você possa imaginar, sozinho. Não apenas prefiro, gosto.

Voltando à parte dos problemas, eu só costumo pedir ajuda quando não há outra opção, e isso não se deve a não confiar nas pessoas que se dispuseram a me ajudar ou pela dívida de honra que se origina depois de receber a ajuda; isso se deve à minha convicção de que se eu posso resolver algum assunto sozinho, assim será, pois o problema é meu. Com essa mentalidade conquistei meu pequeno mundo, e meus amigos sabem muito bem que quando eu peço ajuda é porque realmente estou precisando. Óbvio que muitas coisas eu conquistaria mais rápido com ajuda, mas me sinto imensamente orgulhoso do pouco que tenho e conquistei dando murro em ponta de faca, até a faca quebrar. Eu nunca disse que não era uma pedra de tão teimoso.

Já na fase adulta e me interessando por psicologia, reparei no medo irracional que muitos conhecidos possuem de ficar sozinhos, nem que seja por algumas horas. Existe a concepção de que ficar sozinho é ruim, faz mal, vai te deixar louco.

Vi pessoas chorarem por terem ficado sozinhas quatro horas, pessoas que há mais de trinta anos não reservam um dia para si mesmas, pessoas que vão visitar parentes quando não há ninguém em casa pelo simples medo da solidão, pessoas que estagnaram no âmbito profissional por não saberem como lidar com o tempo ocioso que um pedido de demissão causa. E ficar sozinho é que faz mal?

Percebi que todas estas pessoas possuem duas características: são extrovertidas e têm medo do silêncio. Para elas, um momento em que duas pessoas ficam em silêncio é o cúmulo da falta de proximidade, relações pessoais necessariamente precisam ser divertidas e falantes para serem prazerosas. Para mim, o silêncio é sinal de que não é necessário dizer algo para o momento ser bom.

O medo do silêncio sempre significou, pelo menos ao meu ver, o medo de se ouvir. A introspecção necessita de silêncio. A meditação, o raciocínio, o reconhecimento dos sentimentos mais profundos. Ter medo do silêncio é ter medo de si mesmo.

Eu não sou arrogante a ponto de afirmar que me conheço totalmente, e nem que me aceito na mesma proporção. Todos temos monstros escondidos nas camadas mais profundas da nossa personalidade, mas eu costumo conhecer meus monstros, entendê-los e combatê-los. Isso só é possível através da introspecção.

Pessoas que não se conhecem bem costumam ser superficiais, talvez pelo fato de só conhecerem a superfície de si mesmos. Transferem responsabilidades de seus próprios atos para outros indivíduos só pelo medo de admitirem que possam estar erradas.

Sempre me considerei solitário e nunca tive problemas com a solidão até morar sozinho. Nessa época pude realmente sentir o abismo que é a solidão. E não, não é o que você sente quando ninguém parece te entender ou te apoiar: isso é egocentrismo, puro e simples.

A solidão verdadeira é um buraco na alma, e é muito difícil preenchê-lo. Você pode ir em uma festa e se divertir, mas assim que ficar sozinho de novo o buraco dói. E digo que ele aumenta, pois depois de uma interação social você tem a noção palpável do que não tem. Isso dói demais e com o tempo você evita ver pessoas.
A solidão te deixa apático. Você não chora, nem fica triste ou feliz. Você simplesmente não sente mais nada.
A solidão te dá a sensação e a aceitação da mortalidade. Você não consegue dormir se pensar que um desmaio no banheiro pode te matar, já que não tem ninguém ali para te ajudar. Ou você aceita a fragilidade da própria existência ou volta a morar debaixo da asa da mamãe.

E que fique claro: morar sozinho foi uma das melhores fases da minha vida, mesmo com a solidão. Aconselho a todos que conheço essa experiência e repetiria essa fase da vida sem pestanejar. Tenho saudades dessa época, por sinal.

Depois desse sofrimento com a solidão comecei a questionar se eu realmente sou solitário. Não, eu sou introvertido. Solitário é alguém que não tem ninguém, por opção ou não. Introvertido é alguém fechado em si mesmo, que precisa constantemente de um tempo sozinho para si e tem dificuldades em começar um diálogo com uma pessoa estranha.

E o porque de me irritar com extrovertidos? Além do fato de terem tomado decisões que eu refutei por considerar absurdas, muito das características me irritam por serem apenas versões diferentes das fugas psicológicas que eu uso.
Enquanto eles falam por medo do silêncio mostrar suas falhas, eu não falo pelo mesmo motivo.
Enquanto são superficiais, eu teimo em me afirmar como profundo, justamente pelo medo de ser superficial. Me irritar com essas características mostra a superficialidade da minha personalidade, por sinal.

A conclusão - se é que há alguma - é que o homem sempre buscará a perfeição, em si próprio ou no outro. O problema é que o perfeito é mutável, dependendo do observador. A perfeição que buscamos incessantemente é apenas a nossa dificuldade egoísta de aceitar traços e gostos diferentes dos nossos ideais; dificuldade tão grande que nos faz corromper toda uma forma clara e honesta de enxergarmos o mundo e as pessoas ao nosso redor, com o único propósito de não destruirmos a nossa frágil personalidade.

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