sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Sobre a artística necessidade da música

Fazer arte é só para os fortes. É necessária uma coragem absurda.

O problema não é nem mostrar a sua arte para os outros, mesmo porque a divulgação não é obrigatória. O problema é lidar com os próprios demônios, dominá-los e traduzi-los para uma forma de arte. Esse processo é extremamente dolorido.

A arte é incrível porque por meio dela é possível dizer o que as palavras não conseguem. Pelo menos as minhas não conseguem. Adoraria conseguir sentar aqui e passar para um texto o que eu estou sentindo, mas me falta a habilidade para tanto. Não tem jeito: nunca um texto meu vai passar a tristeza que eu sinto quando eu penso em algumas coisas. Isso até seria possível se eu estudasse e desenvolvesse a minha escrita, mas pra mim a literatura é mais uma arte a ser apreciada do que desenvolvida.

A música era a minha arte. As melodias que saíam da minha cabeça nunca foram tão boas quanto eu achava que deveriam ser, mas eram suficientes boas para eu poder dizer o que queria. As harmonias nunca foram suficientemente densas como eu imaginava, mas o timbre e a dinâmica corrigiam essa minha falha, e o resultado era satisfatório. Por meio da música eu falei sobre o amor, a paixão, a raiva, a solidão, a tristeza, a saudade.

Sempre me disseram que tudo o que eu compunha era triste. Isso acontecia porque poucos sentimentos bons me inspiravam a ponto de precisarem serem traduzidos em acordes e melodias. O processo de composição sempre me serviu como reflexão, tanto é que minhas composições demoravam meses pra ficarem prontas. Eram polidas até a exaustão, até que o próprio sentimento que as originou fosse resolvido, aceitado, aproveitado ou o raio-que-o-parta. Eu só me sentia confortável para mostrar minha música quando me sentisse confortável o suficiente pra mostrar meu sentimento. Terapia pura.

Largar a música foi a decisão mais difícil que tomei na vida. Foi como se eu ouvisse tanta bobagem que acabasse fazendo um voto de silêncio de tão magoado que estava com a linguagem. Foi como parar de pintar por ter raiva das cores, ou parar de escrever por não ver mais sentido nas letras. Perder esse amor pela arte é algo que eu não desejo pra ninguém.

Ultimamente eu tenho sentido muita saudade de tocar, e creio que esteja na reta final desse também doloroso processo de retorno. Parece que eu tenho sentido necessidade de voltar a "falar música".
Creio que só agora, anos depois, eu tenha tido a capacidade de lidar com meus demônios e voltar a traduzi-los em arte. Hoje eu acho que sou capaz de tocar por tocar, e não pra viver.

E realmente, a escrita não é meu forte. Esse texto nem era pra ser sobre isso.